O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, disse na manhã deste sábado que seu governo resistiu à tentativa de golpe militar que na noite de sexta-feira causou caos no país
Segundo informações da mídia local e da agências de notícias internacionais, mais de 2.300 militares foram presos e centenas dos soldados que tinham ocupado pontos estratégicos de Istambul e Ancara, as duas principais turcas, renderam-se.
Erdogan estava de férias em um resort no balneário de Marmaris e retornou a Istambul ainda na noite de sexta para combater a ação dos militares. Em uma entrevista por telefone ao serviço turco da rede CNN Ele afirmou que o ato foi uma “traição” e que fará uma “limpeza” no Exército. O governo anunciou ainda que estuda reinstaurar a pena de morte para punir os participantes da tentativa de golpe.
Por meio de sua conta no Twitter, o presidente pediu que “o povo continue nas ruas para defender a democracia”. O uso da rede social não deixou ser der irônico, já que o presidente anteriormente tentou censurar comentários críticos a seu governo na internet.
Em um pronunciamento pela TV, o comandante interino das Forças Armadas, o generla Umit Dundar, disse que 104 pessoas, descritas como “conspiradoras”, tinham sido mortas em confrontos. Informações extra-oficiais são de que 190 pessoas, incluindo civis, morreram em enfrentamentos nas ruas. Há relatos de que soldados atiraram contra um multidão de pessoas que protestavam na sexta-feira contra o golpe na Praça Taksim, em Istambul.
Tensão
O número de feridos passa de mil.
“O povo foi para as ruas e declarou seu apoio à democracia. A nação jamais esquecerá essa traição. A Turquia irreversivelmente encerrou o capítulo dos golpes militares”, afirmou Dundar, que assumiu o cargo depois de o titular, o general Hulusi Akar, ter sido feito prisioneiro durante a tentativa de golpe.
Foi uma alusão aos quatro golpes militares ocorridos na Turquia entre as décadas de 60 e 90, em que as forças armadas exerceram o que chama de “defesa do secularismo”. Dessa vez, porém, o exército turco não pareceu estar unido em torno da bandeira do golpe.
E tampouco pareceu esperar a reação dos adeptos de Edogan e de seu partido, o AKP, de linha conservadora e religiosa, e que desde 2004 domina a política turca – de maneira controversa, sob acusações de censura da mídia e de cerceamento da liberdade de expressão. Manifestantes foram às ruas, desafiando o toque de recolher imposto pelos golpistas.
E o governo turco acusou os militares revoltosos de estarem alinhados com o Hizmet, um movimento político-religioso liderado pelo clérigo Fethullah Gülen, radicado nos EUA, e crítico ferrenho do regime de Erdogan.
Mas porta-vozes do recluso Gülen afirmaram seu repúdio ao golpe, que classificaram como uma “irresponsabilidade” dos setores militares envolvidos.
Na sexta-feira, pontes foram fechadas em Istambul e aviões militares sobrevoaram a capital, Ancara, no momento em que o grupo iniciou a tentativa de golpe.
De acordo com a agência de notícias estatal Anadolu Agency, tiros vindos de helicópteros militares foram ouvidos próximos ao Complexo Presidencial, em Ancara.
O helicóptero do Exército – que pertenceria ao grupo que tenta tomar o poder na Turquia – acabou derrubado por um avião de combate turco, segundo informações da emisssora estatal NTV.
A agência Anadolu relatou que 17 policiais foram mortos em um ataque aéreo no departamento de operações especiais Golbasi em Ancara.
A mesma agência afirmou ainda que jatos do Exército sobrevoavam a capital para “neutralizar” os helicópteros usados pelo grupo militar.
‘Regime democrático corroído’
Logo nas primeiras horas da tentativa de golpe, o grupo de militares declarou lei marcial e impôs um toque de recolher, segundo informações da emissora estatal de TV TRT.
Uma nota oficial do grupo armado foi lida ao vivo na emissora. “O regime democrático e secular da Turquia foi corroído pelo atual governo. O país agora é administrado por um ‘conselho de paz’ que irá garantir a segurança da população”, afirma a nota. “Uma nova Constituição será preparada o mais rápido possível.”
O trânsito foi bloqueado para cruzar a ponte do Bósforo e a ponte Fatih Sultão Mehmet, duas das principais vias de Istambul.
A agência de notícias AFP relatou que houve uma explosão violenta em Ancara. Além disso, tiros foram ouvidos próximos ao quartel general militar na capital, segundo a Reuters.
Mais tarde, a emissora estatal TRT foi tomada pelo grupo armado, que invadiu os estúdios e tirou o canal do ar. Imagens do caos foram transmitidas na televisão, com homens armados no centro do estúdio, enquanto centenas de funcionários do canal estavam em volta pedindo calma.
A CNN turca também chegou a ser tirada do ar pelo grupo militar, que tomou os estúdios locais. A repórter da BBC Katy Watson, que está no país, compartilhou uma foto do canal de TV ‘vazio’.
Tiros e explosões
Houve registros de tiros e explosões na capital Ancara e também em Istambul. Um dos locais mais violentos de conflito foi a ponte Bósforo, onde diversas pessoas ficaram feridas após confrontos com militares.
No aeroporto de Istambul, todos os voos foram cancelados e só começaram a ser retomandos na manhã deste sábado. Nas ruas, a tensão era visível pelos tanques militares que ocupavam as vias.
A mídia estatal na Turquia também noticiou que uma das explosões aconteceu no prédio do Parlamento, na capital turca.
‘Golpe’
Segudo a agência de notícias Reuters, uma fonte da União Europeia disse que a ação na Turquia parece um “golpe muito bem orquestrado”.
“Parece realmente um golpe relativamente bem orquestrado por partes importantes dos militares, não apenas alguns coronéis”, afirmou.
O primeiro-ministro Binali Yildirim disse à NTV pelo telefone que o governo “não iria permitir nenhuma atividade que pudesse prejudicar a democracia”.
“Houve um ato ilegal liderado por um grupo de militares que agiu de maneira independente do comando central do Exército. Nosso povo deve saber que não vamos permitir isso”, afirmou.
Enquanto isso, a população passou a lotar lojas e supermercados para abastecer suas casas. Um repórter da BBC em Antália compartilhou imagens de filas imensas em postos de gasolina ou caixas eletrônicos e até lojas de conveniência – segundo relatos, sensação no país é de “golpe”, e a população estáaria tentando se preparar para dias difíceis que estariam por vir.
Reação internacional
O presidente americano, Barack Obama, se manifestou por meio de nota sobre a situação e fez um apelo para todos os partidos da Turquia apoiarem “o governo democraticamente eleito e evitar qualquer violência ou derramamento de sangue”.
No Brasil, o ministro das Relações Exteriores, José Serra, também soltou uma nota pedindo “respeito às instuições e à ordem constitucional”.
“Em relação aos acontecimentos em curso na Turquia, o governo brasileiro insta todas as partes a se absterem do recurso à violência e recorda a necessidade de pleno respeito às instituições e à ordem constitucional.”
O ministro das Relações Exteriores russo, Sergei Lavrov, disse que é importante “evitar um banho de sangue”.
Matéria completa publicada no site da BBC – Internacional